A Sociedade vive o sintoma da erosão que o descrédito proporciona.
Parece que a mediatização, pela opção voyerista em nós, na aceitação em nos expormos e observar quem se expõe, acabou por permitir que patéticas cenas como a que se passou no lançamento da biografia de Carlos Cruz se passem sem um juízo crivel das entidades responsáveis.

Vamos a factos concretos antes de partir para a efusiva análise do conteúdo patético do que tudo representa num País que se faz juiz de um julgamento em Praça Pública.

O Caso Casa Pia, ou Processo Casa Pia como viria a ser chamado, parte de uma investigação da jornalista Felicia Cabrita, anunciada de forma mediática a 23 de Setembro de 2002.
Nesse dia o País tomou conhecimento de Bibi, um funcionário da Instituição, que além de abusar de jovens – como Joel, o acusador – angariava menores para reputados e influentes da Praça Portuguesa.
O escândalo rápido teve repercussões quando entre o rol de famosos estava Carlos Cruz.
Não só o seu nome era mencionado agora como havia sido referido antes, numa acusação arquivada em 1981, quando um funcionário da Casa Pia foi acusado de violar menores por um período de 30 anos.

O sintoma inquisitorial do sangue latino, fervilhante e vingativo, sobretudo tratando-se de crimes envolvendo menores, condenaram de imediato o Sr. Televisão, facto que apenas piorou quando o seu assistente, homónimo de nome, Carlos Mota, disse que “se o Carlos Cruz é pedófilo, eu também sou!”. Pelos vistos, face à luz da condenação final, são os dois.

É aqui que o acórdão do Colectivo de Juízes, lido a 3 de Setembro de 2010, é inegável, após um Processo longo, complexo e nunca antes visto na justiça Portuguesa: Carlos Cruz foi declarado culpado do crime de pedofilia.
Segundo a leitura da juíza Ana Paredes, cometeu abusos na “casa das Forças Armadas” com um menor de 14 anos, e na casa de Elvas, com um menor de 16 anos, sendo, por tal, condenado a 7 anos de prisão.

De lá para cá o ex-apresentador tem cumprido a sua pena de uma forma semi-pública. O seu silêncio tem sido mediatizado a cada vez que surge para fazer uma campanha pela sua inocência contra o que chama um julgamento manchado pela suspeita dele ser o erro processual para justificar o sensacionalismo em torno do que foi o Caso Casa Pia.

Carlos Cruz.jpg

Agora, nesta Semana Santa, a 23 de Março de 2016, lançou a sua Autobiografia “Uma Vida”, sobre o seu percurso pré-julgamento. Nada de pedofilia, nada de Casa Pia, nada que o comprometa com aquilo que, agora, o torna num pária da Sociedade.
Só que Carlos Cruz não se tornou num pária da Sociedade.
A justiça tingida de mediatização à portuguesa não tem esse condão que o nosso congénere anglo-saxão logra. Carlos Cruz elevou-se à honra de parecer um Homem pelo qual nenhum juizo de crime com menores alcançou.

A sua saída precária para lançar o livro onde aproveita para se indiciar parte de um outro crime – revelando o conhecimento de tráfico de influências na atribuição do euro 2004 e nada ter feito então – é recheada de convidados que o vêm abraçar e cumprimentar.
Não só isso como duas instâncias públicas estão presentes num total desrespeito pela Sociedade Civil e que passam, de uma forma deturpada, o respeito que se deve ter pela justiça que a todos nós representa.

Além das celebridades que apoiam, licitamente, Cruz, entre os seus convidados e apoiantes, surge não só o Ministro da Cultura – representante do Governo, como D. Januário Torgal Ferreira, o actual bispo emérito das Forças Armadas e Segurança, quem apresentou o livro.

Não sou de fazer um juízo de capitulação, nem de achar que na actualidade do Capitólio à Rocha Tarpeia sejam apenas dois passos, mas o princípio do “diz-me com quem andas dir-te-ei quem és” aplica-se aqui de forma inaudita.

Carlos Cruz foi acusado, julgado, encarcerado.
Mas pelos vistos é mais livre que todos nós…

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