Andamos numa época de confusos.
Ou na tragicomedia dos que se procuram definir.
Li a grande entrevista de vida de José Miguel Júdice, amigo da Família, pessoa a quem chamo, em intimidade, de tio, na revista do Expresso e fico com esta estranha sensação psicoanalítica do Übermensch de Nietzsche.
A entrevista, conduzida por Clara Ferreira Alves, é o alinhavar confuso sobre essa busca do Pai ideal que não se teve versada no Homem que se quer ser face ao político que, ao existir nas sombras, nunca foi.
É um retrato triste de alguém que parece ter passado pela vida sem que a vida por ele tivesse passado. Pior, a sua indefinição política, criada nessa génese do que havia de ter sido face ao que foi, na transição do 25 de Abril demonstra bem a confusão orgânica do Portugal actual.
Um Portugal que se identificou com Cavaco e nele cuspiu, votou maioritariamente em Sócrates e dele tem amnésia. Que chamou Passos a resolver uma crise e vive aziado com essa memória perante o triunfo fatalista do Dr. Costa.
Por vezes parece que nos vemos Gregos para encontrar a nossa identidade.
Menor graça teria se uma citação houvesse do Primeiro Ministro a dizer que a mudança ocorrida na extremista Grécia do Syriza fosse o ideal a seguir. Há?
Explica muito.
Mais explica o ar embevecido com que se tem olhado para a eleição do novo Primeiro Ministro Inglês através da escrita de Frederico Lourenço.
Escritor, tradutor e professor universitário português, Frederico Lourenço é um dos grandes especialistas de línguas e literaturas clássicas, em particular de grego clássico, que esta semana nos brindou com uma (a)crítica homenagem a Boris Johnson colocando relutante pergunta que se responde: “mas isso de uma licenciatura em Grego e Latim serve para quê?”; “serve para ser primeiro-ministro”.
(Será que perder eleições serve o mesmo princípio? Pedro Sánchez que responda ao Dr. Costa.)
O ilusório elogio que muitos papalvos, viralmente, republicam em sinal do superior intelecto de Johnson – por, alegadamente dominar uma língua morta e o estudo clássico dessa que nos relegou a Democracia – não deixa de esconder a óbvia tragicomedia dos tempos presentes: o latim – por mais fascinante que seja – não passa de anotação de pé-de-página ou citação jurídica para o comum dos letrados, enquanto a Grega Democracia não tem nada que ver com a Democracia que hoje se pratica, muito menos com aquele que se tem assistido na Grécia (alvíssaras a Costa & cia), nem falando no desunido Reino que de unido apenas tem o nome.
Andamos todos perdidos, os políticos pior.
Não, não é por ter uma licenciatura em Estudos Clássicos, ter estudado na Universidade de Oxford, em Balliol College – tradicionalmente o colégio dos inteligentes – que o novo Primeiro Ministro Inglês terá a inteligência para lograr uma saída menos conturbada que aquela que May não conseguiu fazer.
Se assim fosse a Democracia salvaria a Humanidade. Ainda não salvou.
Os Estudos Clássicos também não, e até agora o Übermensch só existe na banda desenhada.
De resto, apesar do triunfal discurso de tomada de posse, Boris esbarrou contra Junker e o Withdrawal segue a melhor opção. Quem saiba a conversa com Merkel traga algo de greco-clássico e democraticamente se termine este ‘cui bono’ que o Brexit se tornou?
Com o perdido que se anda, pode ser a melhor solução a meio de tanta confusão.
Afinal o intelecto que se aproveita pode e deve ser aproveitado quando o Estado de Direito Democrático se reflecte na vontade de uma maioria presente. Mas quando no dia após o referendo do Brexit a maior pesquisa foi justo do que se tratou a saída do Reino Unido da União Europeia, ou aqui em Portugal celebrar maiorias absolutas com abstenções de 70%, acredito não haver sapiência académica que nos resgate…
Afinal para que serve uma licenciatura académica afinal?
Nisso concordo com Frederico Lourenço, ‘pra ser político profissional’.