O slogan da Federação Portuguesa de Futebol para este Europeu de Futebol foi, inteligentemente, “não somos 11, somos 11 milhões”.
É apelar ao sentimento Patriótico e Nacionalista que, dentro de cada português, hoje domingo, bate nessa esperança da vitória em ultrapassar tudo.
Acontece o facto que, desses 11 milhões de Portugueses que assistirão à final, eu não serei um deles. Não porque não vá ver o jogo, mas porque sou Brasileiro.
É mais certo que, sendo Brasileiro – verdade que apenas na Nacionalidade que herdo de tempos de revolução – mais me aproximei dos 11 milhões de desempregados que o Brasil em tempos de crise sistémica infelizmente tem. E digo “aproximei” porque, após um período de seis meses desempregado (onde nem sempre mantive a cabeça fria de que tão rápido encontraria um fim para este momento de agravo pessoal) encontrei trabalho.
A minha Solitudine, tantas vezes feita nas memórias daquilo que merece ser lembrado como o melhor que temos, repercutiu efeito e acabei de assinar contrato com uma multinacional.
Acho que nunca antes havia falado que estava sem trabalho. Começo por dizer, numa nota mais pessoal, que não acredito nesse conceito de emprego. Respeito a sua necessidade, o “das nove às cinco”, picar ponto, restringir o tempo em detrimento de ter menos liberdade mas mais garantias.
Eu prefiro um trabalho. Nada é tão garantido, tudo é um desafio, mas a liberdade é única. A minha solidão – tão partilhada – assim me o permite.
Em Janeiro passado iniciei o ano em busca de novo rumo. A arquitectura que queria acabou. Vivemos num star system complexo onde a criatividade já não é recompensa e o objectivo é o mass media.
O bom de não se ter medo de arriscar, mesmo celebrando 33 anos, é saber que a vida se faz mais de experiências e menos de currículos.
Inscrevi-me na Segurança Social, estive este tempo a receber os descontos que me cabiam – e que falta me faziam – e fui ao Centro de Emprego.
É em parte o fantasma que todos dizem ser. É o porque a maioria deixa que seja. Sim, todos somos o nosso número de Segurança Social, de Contribuinte e de Cidadão. Ninguém é um rosto que o Estado Social goste de tratar de forma Social. É errado, claro, mas se formos uns para os outros, em lugar de agressividade, recebemos compreensão.
Não é fácil, assusta, é tremendo. Mas as regras são regras. Por vezes podem ser quebradas – o protocolo nunca – mas se soubermos comunicar, dialogar e nunca faltar ao respeito, é certo que a máquina do Estado não nos engole.
Leio com certa graça o dogmatismo político com que determinada Esquerda apresenta as idas ao Centro de Emprego ou as apresentações quinzenais como uma humilhação ao cidadão desempregado.
Eu apresentei-me 11 vezes na minha junta de Freguesia, chegando a existir uma em que o sistema falhou e tive que ir ao Centro de Emprego regularizar a situação. Nunca me senti humilhado e mais, compreendi o propósito das ditas apresentações. Além de manterem uma disciplina em alguém que cumpria objectivos, mantinham-me a cabeça ocupada enquanto procurava trabalho. Claro que de tanto se ir carimbar presenças acaba por se conhecer quem nos recebia, travam-se amizades, vêem se rostos em condições semelhantes, trocam-se experiências. Aprende-se. E mais, há formações que nos valorizam. Fiz duas, não me senti menosprezado, mas vi quem se sentisse.
Claro que não sou insensível e compreendo que nem todos podem ir sempre, numa base regular, marcar presença. Para alguém com maiores dificuldades económicas ou de locomoção, sim, podem haver formas alternativas de representação. Confirmação telefónica com reconhecimento local, emails com lógica semelhante.
Aparte disso tudo o fundamental é – e esta parte é a mais complicada – não perder a esperança.
Já antes o disse e repito. Cansei-me da Arquitectura. Hoje em dia escrevo, permaneço criativo. Desde 2011 estou, pro bono, na Le Cool Lisboa, no ano passado criei afarpa.com, nunca deixando de estar, mentalmente, ocupado. Ler, escrever, criar, dar de mim aos outros e receber de volta.
Nas inúmeras candidaturas que enviei, na busca activa de trabalho, havia sempre um paragrafo que era igual: “Aspiro a ser mais que um mero licenciado com credenciais e um currículo, mas um bom profissional, com a experiência que a vida me ensina.”
A vida ensinou-me que, apesar de termos muitos amigos, ter até conhecimentos que nos podem abrir portas, conhecer quem cunhas por nós possa meter, entrar pela porta do cavalo, nada disso me traz a satisfação do reconhecimento pessoal.
Candidatei-me sendo eu. Sendo o Francisco Moura Pinheiro, sem referências de passado familiar ou ajudas de amizades.
Fui quem me ensinaram e aprendi a ser. E consegui.
Começo onde o meu mérito profissional, mas sobretudo pessoal, me permite. O resto é futuro.
A minha felicidade é tanta quanto acreditar na vitória de Portugal nesta noite.
Serei esse Português de importação a mais nos onze milhões que “no estádio” assistem ao jogo.
E venceremos!