A crença como forma resolutiva numa continuidade que apague a culpa relativa aos equívocos cometidos durante a vida é o meio mais comum para professar uma fé.
Muitos preferem relegar a outrem a responsabilidade dos seus actos do que assumi-los, contingente que faz a maioria dos reclusos beneméritos pregadores assumidos. Só que essa sina é uma sanha cínica que se desenha ao longo de uma vida fabricada em torno de uma Sociedade permissiva que esculpe o individuo para se tornar no que é.
Certo que o adverso é algo que surge como inconsequência inexplicável, mas a maioria dos casos de acto e consequência têm uma razão primordial.
Do Brexit ao Brasil lavado a jato – tema que anda omisso nos meus textos – essa sina é mais que uma resenha de cinismo incorporada.
Quem sabe o padrão que se estabeleceu na actualidade, quer na desunião Britânica quer no Brasil afligido por uma letárgica corrupção, não tenha uma origem explicita, mas o justicialismo está para ambas como a chegada de um Messias Salvador.
Não sei se o pronúncio arrogante de Nigel Farage no Conselho Europeu, “Bem, tenho de dizer que agora vocês já não riem, pois não?”, lembrando quando havia chegado ao Parlamento Europeu dezassete anos antes e proposto a ideia da saída do Reino Unido da UE sob risos da oposição, não demonstra apenas o cinismo que encabeça este justicialismo com causa mas sem consequência.
Evidente que Jean Claude Junker foi ele também arrogante e tenaz quando apartou a comitiva Britânica na sua relevância dentro do parlamento, mas o facto contundente é que, para todos os efeitos, a escolha – Democrática, recorde-se – foi do Reino Unido.
É tudo uma questão de Justiça? Sim e não, pode ser uma questão justicialista também. O ser cínico tem essa expressividade.
Se por ora o acto constrangedor parece ser melhor para um Reino que se diz mais Unido face a uma Europa em tumulto político em cause de razão populista, a verdade é que nem o Reino alguma vez foi totalmente partidário do Europeísmo, nem a razão lógica que nos unia uma crença com força de fé Messiânica.
Por tal, e como não poderia deixar de ser, não é com surpresa que o mesmo Nigel Farage se viu obrigado a desmentir, horas depois do seu “Dia da Independência”, que uma das promessas do Leave era falsa. Afinal não há 350 milhões de libras para o NHS como anunciado.
Ou seja, por vezes mais vale não dizer nada a fazer passar uma imagem idealizada de algo que não se é.
Alguns chama-lhe falsa virtude, eu chamo hipocrisia, e embora este tipo de cair da máscara possa trazer consigo uma sensação de justiça, por vezes é apenas o dito justicialismo aplicado.
O discurso de regresso ao plenário do Senado da Senadora Gleisi Hoffmann depois de na semana passado o seu marido, Paulo Bernardo – ex-Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão de Lula e ex-Ministro das Comunicações do primeiro governo de Dilma – revelam uma consciência ciente dos actos mas nunca das consequências.
Por outro lado demonstram bem como o incômodo do cinismo apenas recai sobre os que muito apedrejam quando são eles a levar com o apedrejamento. Nesse instante questionam o porquê de serem eles os julgados se antes eram os julgadores.
Mas para a sina do cinismo haja uma sanha de contentamento, pois a defesa que a Senadora faz em nome próprio, digna de telefilme evangélico, trouxe desde logo uma coerciva jogada política onde se misturam factos e argumentos sob a batuta da mentira. Ao fazer parte da defesa da Presidente afastada, enquanto membro activo na Comissão Especial do Impeachment, Gleisi consegue fazer da prisão do seu parceiro razão política-ideológica-social para ser vítima do Golpe que pretende afastar o poder instalado no Brasil.
Todos os argumentos – deturpando até factos – têm servido para desvirtuar uma realidade cada vez mais concreta, em causa do cinismo político do governo de Dilma a crise económica e social é impossível de se esconder.
Por lá essa foi a razão primordial. Aqui, quem sabe, o Brexit seja afinal a saída jurídica para o justicialismo que se instalava.