Em 1906 Evelyn Beatrice Hall, sob o pseudónimo S. G. Tallentyre, escreve aquela que se tornaria a mais memorável citação de Voltaire; “Eu desaprovo totalmente o que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo.”, sendo que a mesma, a não ser de facto uma citação (polémicas à parte), logra encapsular esse ‘espírito’ de Voltaire, o espírito da Liberdade que por milénios o Homem se batalhou por construir.
Este princípio, tanto do despotismo iluminado que com o terramoto Lisboeta nos trouxe Cândido, como desta noção mais abrangente germinou na noção ampla do que é o Direito Universal a que chamamos Democracia, parte deste pressuposto do direito a ter Direitos. Do respeito mútuo e da defesa – muitas vezes em contra si próprio ou num extremo até à morte – por aquilo que o meu oposto ou oponente defende como o que uma maioria consente como o mais apropriado e de acordo com o vigente.

Evidente que nenhuma forma de governança é em si perfeita, e nem sempre o todo, mesmo em minoria qualificada, decide aquilo que de melhor convém.
Por isso se fazem revoluções, há golpes, crises que despontam guerras e simples ideias conseguem derrubar não só regimes como impérios.
Mas no final, dentro do pluralismo cultural, de uma Sociedade rica nos hábitos e onde a censura são página virada, não cabem hábitos de censura cultural por princípios dogmáticos onde o medo exerce fantasmas passados e esse reverberar de desaprovação já não merece luta até à morte senão um cancelamento prematuro por discordância ideológica.
Dizer que a Sociedade actual está dicotomizada é cair nesse erro cinematográfico dos ‘bons contra os maus’, tão propício para audiências televisivas, mas é verdade que, entre acordos a que se dizem chega e presidências que se negam a conceder, o Espírito da Liberdade parece prisioneiro de um tempo em que o indivíduo era refém da sua ignorância.